domingo, 24 de janeiro de 2010

Tormenta

A gente nunca passou por nenhum esquema de tortura e tals, mas temos a mania de falar que estamos sendo torturados sempre que temos que passar por alguma situação que não nos apetece. Um programa de TV, um programa de índio, uma reunião com o chefe, olhar pra pessoa que você sente aquele tesão e não poder falar nem fazer nada. Passar em frente uma doceria na pior fase do seu regime, entrar num empório de bebidas enquanto deve se manter abstêmio. Enfim, essas coisinhas do dia-a-dia que chamamos de tortura.

Mas seria a mesma dor? É possível compararmos essas dorezinhas momentâneas a algo como tortura?

Bom, na definição do dicionário, sim. Porque a tortura em si é traduzida como angústia, dor e sofrimento. É torturante ter que ficar em casa quando se quer sair, torturante a convivência com pessoas que você não gosta ou simplesmente é obrigada a conviver, mas não quer. Aquelas pequenas provocações públicas que os amantes costumam fazer, como brincadeira, atiçando o fogo um do outro. Assistir a esses programas de culinária quando você não tem nem um miojo em casa.

Ouvir pagode no ônibus [numa daquelas infinitas demonstrações de pobreza de espírito que surgiram desde a invenção do celular com MP3 a preços populares] quando você não tem nenhum fone de ouvido para se isolar do mundo. Pode substituir pelo ritmo que você odeia, o que mais me aflige por exemplo é o funk. Ver seus amigos combinarem uma festa justamente naquele dia que você não pode sair de casa, ou porque já tem um compromisso marcado, ou porque prometeu pra sua mãe que iria levar sua tia Cocotinha de 60 anos pro bingo.

Uma sensação de angústia tão grande aperta o nosso peito nessas horas. Como se aquele momento fosse durar para sempre, como se a gente fosse ficar paralisado ali, por horas, por dias. Como se não houvesse a opção de não termos que viver isso. Como uma obrigação. Sofrer é uma obrigação.

Mas não é. Você pode sempre pegar outro ônibus e se atrasar um pouco para qualquer compromisso que seja, e evitar o estresse e a angústia de ouvir o som que você não quer. Se o programa de TV te irrita, você pode trocar de canal, ou ir dormir. Se o seu amante está te provocando em público, lance a proposta do motel e acabe com a tortura sexual. Não aguenta mais ficar em casa, saia. Tá fazendo regime, pare de olhar pra comida como se aquilo fosse sua salvação. Resolveu parar de beber, evite os bares e empórios.

Durante muito tempo, eu procurei uma solução para a tortura que é amar. Amar e não ser amado, que é uma dor que parece que nunca vai acabar. Que parece que a gente vai morrer disso. Amar e não ser amado se equivale, para alguns, a uma faca sendo cravada no peito todos os dias. E a ferida se cura à noite e no dia seguinte a faca tá lá, novamente. Porque parece que é incompetência nossa, essa de não ser amado [mas sobre essa incompetência eu falo outro dia].

Pois bem, tem solução. É simples, é fácil, muito mais fácil do que você imagina: ame a si mesmo. Se venere, se idolatre, se adore, se seduza. Seja apaixonado ou apaixonada por si mesmo(a). Porque quanto mais você se amar, mais fácil será superar a angústia da faca entrando no peito todos os dias. Você pode até sentir a faca entrando no seu peito, mas ela não passará o dia inteiro lá, até a noite cair.

Você conseguirá delicadamente tirar a faca, e viver a vida de peito aberto. Porque amar alguém pode ser muito gostoso... doloroso e gostoso. Mas muito mais divertido é se apaixonar por si mesmo todos os dias.

E o melhor: muito menos torturante.

8 comentários:

Andarilho disse...

Se a tortura vir do Jack Bauer, isso tudo ai é fichinha, hahaha.

Sofrer nunca é obrigação. É opção. Mesmo entre aqueles fudidos dos haitianos, aposto que deve ter umas Pollyannas lá.

Agora, esse negócio de amor, eu tenho outra solução: odeie. É na verdade a mesma moeda, só outro lado.

Mas claro, se apaixonar por si mesmo é muito mais self help ;)

Ana P. disse...

Não é fácil decidir odiar. Bom, pra mim não é. Porque como você disse, é a mesma moeda, só o outro lado. E a distância de um lado pro outro é ínfima. Por isso prefiro canalizar.

Odiar cansa. Amar não.

Andarilho disse...

Como assim, amar não cansa? Eu acho que cansa tanto quanto odiar, afinal, são dois lados da mesma moeda.

Eu prefiro odiar, já estou acostumado a isso.

Dois cigarros e um café. disse...

Adorei o post, é tão bom tirar a faca da tortura (que nos impomos) todos os dias, que é realmente libertador, amar é isso, liberdade talvez...

Beijundas ^^

Unknown disse...

Amar é desconcertante. E pode ser um caminho para a tortura eterna. mas é melhor fazer as tentativas amando que odiando, com certeza!

Carina Carvalho disse...

"deixa acontecer naaaturalmente! eu não quero ver você choraaaar!"

hahahaha desculpe...depois da parte do pagode no ônibus não consegui recuperar a seriedade. ._.

Ana disse...

Uma palavra pra vc xará: ORGULHO!
Tô orgulhosona de vc!
beijo

Ana P. disse...

Andarilho: eu acho que amar... bom, não é bem cansar a palavra. Só cansa quando você não recebe amor de volta. Aí até te entendo.

Cristal: amar é liberdade, POIS É. Definiu tudo.

Will: caminho para tortura, ou não. Pq pode ser bem torturante, mas eu ainda acho que dói mais odiar alguém. E dá mto mais trabalho, pra odiar você precisa se esforçar mto. Pra amar não.

Carina: cara, sério, eu fiquei com essa música na cabeça dois dias inteiros, valeu!

Ana: eu tb me orgulho de mim. Aos pouquinhos eu acho que chego lá.

=)