sábado, 29 de agosto de 2009

Textos proibidos

Tinha um caderno com a capa de borracha preta. Ele era espiral, não era lá muito prático pra escrever quando o espiral estava do lado esquerdo, mas e daí? Não era isso que fazia o caderno algo especial. O que fazia daquele caderno, O CADERNO, eram seus textos proibidos.

Uma coisa parecia certa, todo mundo tinha seus pensamentos mais escondidos, que dava uma certa vergonha, ou talvez medo de mostrar aos outros. Esses pensamentos eram todos colocados no caderno de capa de borracha preta. Era um ciúme desse caderno, porque quem encontrasse o caderno, encontraria sentimentos escondidos, que tinha receio de assumir até mesmo pra si.

Às vezes não são nem sentimentos, o que o caderno de capa de borracha preta esconde é uma personalidade estranha, não reconhecível no espelho, alguém com medo demais de viver. Alguém com medo de decepcionar a si e aos outros, medo de ser feliz demais e não merecer. Medo que as profecias se realizem, que acabe se tornando um ser... que apenas é.

As páginas do caderno mudavam de humor conforme seu próprio humor mudava. Alguns dias você encontrava textos felizes, cheios de luz, de flores, de perfumes, de abraços e de sorrisos. Outros dias, no entanto, você encontraria marcas de lágrimas, dor e cansaço. O cansaço, aliás, parecia entrar disfarçado também nas páginas felizes. No meio dos sorrisos, alguma lágrima teimava em aparecer.

Mas não é porque tudo era apenas tristeza. As lágrimas e o cansaço estavam lá porque no fundo, cansou de carregar esses textos proibidos pra cima e pra baixo. Queria gritar ao mundo algumas das verdades que prendia com letras apressadas nas folhas do caderno de capa de borracha preta. Queria rasgar aquelas folhas e picotá-las, soltar cada ideia ao vento, deixá-las livres para quem tivesse a coragem e a vontade de recolhê-las.

No fundo, queria que viver sem questionamentos deixasse de ser proibido. E então não seriam mais necessários cadernos espirais de capa de borracha preta. E a história passaria a ser apenas vivida, e não mais escrita. Nem de verdade e nem de mentira.

6 comentários:

Andarilho disse...

Esse seu caderno era seu terapeuta.

E que fim levou ele? Ainda está lá, oferecendo suas páginas em branco?

Ana P. disse...

Eu não tinha um caderno, beibe... a minha vida inteira tem sido escrita e mantida a salvo dos outros.

Kuka disse...

Eu tive um tb.
Só tive coragem de abrir na terapia, anos depois.
E doeu, sabe? rs
Bjos!!!

Ana disse...

E o caderno virou blog...e, as ideias, antes tão sigilosas, quase sufocadas em meio àquelas folhas de papel, agora são criptografadas em letras digitadas numa página de internet.
E assim, elas podem voar, ganhar o mundo e chegar aos corações de quem é capaz de decifrá-las!
Beijos

jujudeblu disse...

É, bonita a história! Qdo adolescente eu mantinha minhas agendas do colégio como diários, contando as histórias que vivia, mas hoje em dia não tenho mais essa disposição.

Anônimo disse...

Obrigado por intiresnuyu iformatsiyu